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Liderança e Resultados sob a Ótica da Gestão de Riscos

Resumo

  • As ruínas da fábrica de pólvora da família DuPont ainda podem ser visitadas. O local hoje está restaurado e foi transformado em museu

  • Na foto, o riacho que aparece ao lado do prédio (um moinho de pólvora!) é o Brandywine Creek, fonte da água que debelou os incêndios da Eleutherian Mills quando não existiam sprinklers ou bombas de incêndio

  • As aberturas nos prédios são na realidade bocas de explosão dos moinhos e não estão viradas para o riacho por acaso

Literatura recomendada

  • “Industrial Safety is good business – the DuPont history”

Autores: Willian Mottel, Joseph Long e David Morrison
Editora Wiley

 

  • “Os Americanos”

Autor: Antônio Pedro Tota
Editora Contexto

 

  • “O que houve de errado”

Autor: Trevor Kletz
Editora McGraw Hill

O binômio prevenção x reação – parte I

Ano de 1817, estado de Delaware, litoral leste dos Estados Unidos. Uma pequena fábrica de pólvora (produto estratégico para aquele século de desbravamentos e guerras nos EUA), chamada Eleutherian Mills, criada 15 anos antes por uma família de imigrantes franceses, é atingida por um incêndio. A brigada foi formada pela própria família (incluindo mulheres e crianças) e funcionários presentes, com o combate às chamas realizado na base do balde passado de mão em mão. O fogo é finalmente debelado, mas um dos brigadistas – o patriarca Pierre de Nemours, então com 78 anos – sofre um ataque cardíaco causado pelo esforço excessivo e falece 3 semanas depois. O que seria possível aprender com a história Monsieur Pierre e o incêndio da Eleutherian Mills?

Até que ponto convém investir em resgates?

Sendo mais preciso, o Pierre de Nemours da nossa história atendia pelo nome completo de Pierre Samuel du Pont de Nemours, um francês que se exilou com a família nos EUA em 1799, depois de ter se livrado por um triz da guilhotina da Revolução Francesa. Em solo norte-americano, junto com mulher e dois filhos, Monsieur Pierre começou em 1802 um negócio de fabricação de pólvora, atendendo a um pedido especial do então presidente norte-americano, Thomas Jefferson. A Eleutherian Mills deve seu nome ao filho caçula de Pierre, Eleuthére Irénée DuPont, um talentoso químico experimental que foi aluno de Lavoisier (o pai da Química Moderna, mas nem por isso poupado da guilhotina). A Eleutherian Mills se tornaria mais tarde a DuPont que você provavelmente já conhece, a empresa de grande porte norte-americana com mais tempo em atividade.

Neste momento, por uma questão de justiça, é preciso lembrar que a busca pela excelência no Gerenciamento de Riscos que, mais de um século mais tarde, faria da DuPont uma referência nesta área, não nasceu do incêndio que vitimou Pierre DuPont -  aliás, à época deste acidente, a Eleutherian Mills já tinha um modelo de gestão de riscos relativamente avançado, pelo menos para os padrões da época. Tampouco este foi o único acidente grave na Eleutherian Mills. Antes de 1817, outras incêndios haviam sido registrados e, nos anos seguintes, novos acidentes sérios também aconteceriam. Mas é certo supor que todos estes revezes devem ter contribuído para a construção da visão DuPont de que as emergências têm resultados imprevisíveis e que é a excelência na prevenção e no gerenciamento de riscos, combinados com a reação e o combate como contingência, o que traz os melhores resultados.


E como aplicar as lições não apenas da DuPont de Monsieur Pierre, mas de todas as experiências que tivemos ou de que soubemos para entender o real papel da emergência e do resgate num Sistema de Gerenciamento de Riscos equilibrado, quer dizer, um Sistema de Gerenciamento de Riscos capaz de equilibrar prevenção com resposta às emergências na medida exata de cada?

Para equilibrar o binômio prevenção x reação, um caminho seria aplicar uma visão de “raio-X energético” sobre nossas operações. Se fizéssemos isso, revelaríamos uma rotina incrivelmente perigosa: trabalhos frequentes a muitos metros de altura do solo (ou abaixo dele), cargas gigantescas sendo içadas a todo momento, manobras em circuitos elétricos sob milhares de Volts, operações unitárias com temperatura e pressões elevadíssimas. Aparecerão também milhares de litros de inflamáveis armazenados em nossas unidades, além dos outros produtos químicos de elevado risco de que dependemos para produzir. Bastante não fosse, mostraríamos no filme as milhares de toneladas de matéria-prima e produtos acabados acumulados em tanques e silos, uma energia potencialmente fatal.


A “visão de raio-x” deste ambiente nos conduz ao primeiro limitante dos resgates e respostas às emergências: convivemos com energias concentradas demais. Nestas condições, um acidente em que haja contato direto com uma energia desta magnitude (digamos, uma manobra errada em alta tensão ou um engolfamento num silo de grãos) tem o poder de destruir vidas humanas instantaneamente, muito antes que qualquer resgate possa atuar. Por melhor que seja seu equipamento de emergência e por mais bem preparada que seja sua equipe, é preciso reconhecer que o primeiro contato de uma energia assim com um corpo humano joga automaticamente nossas chances de sucesso no resgate para o campo do improvável (ou do milagre, se você assim preferir). Mesmo com a barreira de EPIs e EPCs, ainda assim é energia demais. Esta é uma das razões que explicam por que são relativamente incomuns os casos bem-sucedidos de resgate em espaços confinados, por exemplo.


O segundo limitante para a eficiência dos resgates e emergências é tão visível quanto o primeiro: o resgate e o combate às emergências são perigosos por natureza. Histórias como a de Pierre DuPont e de tantos outros antes e depois dele e, mais recentemente, dos 343 bombeiros mortos no 11 de Setembro ou das dezenas de profissionais que anonimamente doam e doarão suas vidas todos os anos em atividades de resgate e salvamento trazem lições valorosas: na vida real, as atividades de resgate e emergência são pura tensão e risco e, mesmo quando executadas por gente que se dedica ao ofício, ainda pode ter consequências desastrosas. Agora imagine seu pessoal, homens e mulheres da sua unidade, à frente de resgates complicados, correndo contra o tempo e enfrentando energias gigantescas. É um convite ao imprevisível.


Estes dois limitantes já seriam suficientes para que as operações de resgate e resposta às emergências fossem repensadas em sua utilidade. E “repensar” não significa “negar a importância”, mas reavaliar o ponto de equilíbrio entre os investimentos para prevenção e planejamento de trabalhos perigosos, versus os investimentos nas operações de resgate e resposta às emergências. Ao reconhecermos energias tão fabulosas em ação e assumir que resgates e respostas às emergências são perigosos por natureza, é prudente refletir sobre se estamos investindo tempo, recursos e foco no lado certo da balança. Isso inclui os esforços de treinamento e capacitação de um lado e de outro, mas vai além e toca a estratégia de Gestão de Riscos de cada negócio.


E há ainda um terceiro limitante das operações resgate e emergência, assunto da segunda parte deste artigo, em que também discutiremos casos especiais e as situações em que é preciso dar atenção diferenciada aos programas de resgate e de resposta às emergências. Nesta segunda e última parte, o resgate e as respostas às emergências aparecem dentro do módulo de Gestão de Crises, uma das disciplinas decisivas do Gerenciamento de Riscos. 

É isso por hoje, pessoal. Muito obrigado pelo seu tempo, até mês que vem.

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